sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Sociologia - EXERCÍCIOS DE SOCIOLOGIA módulo I

Exercícios – Sociologia
PERGUNTAS DE UM TRABALHADOR QUE LÊ.
Bertold Brecht
Quem construiu a Tebas de sete portas?
Nos livros estão os nomes dos reis.
Arrastaram eles os blocos de pedras?
E a Babilônia várias vezes destruída –
Quem a reconstruiu tantas vezes? Em que casas
Da Lima dourada moravam os construtores?
Para onde foram os pedreiros na noite em que a
Muralha da China ficou pronta?
A grande Roma está cheia de arcos do triunfo.
Quem os ergueu? Sobre quem
Triunfaram os Césares? A decantada Bizâncio
Tinha somente palácios para os seus habitantes?
Mesmo na lendária Atlântida
Os que se afogavam gritaram por seus escravos
Na noite em que o mar a tragou.
Os que se afogavam gritaram por seus escravos
Na noite em que o mar a tragou.
O jovem Alexandre conquistou a Índia.
Sozinho?
César bateu os gauleses.
Não levava sequer um cozinheiro?
Filipe da Espanha chorou, quando sua
Armada.
Naufragou. Ninguém mais chorou?
Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos.
Quem venceu além dele?
Cada página, uma vitória.
Quem cozinhava o banquete?
A cada dez anos um grande homem.
Quem pagava a conta?
Tantas histórias.
Tantas questões.
1‐ Analise e destaque a idéia central do texto acima.
2‐ De acordo com o mesmo texto assinale a resposta correta.
A História da Humanidade é produto do talento de um único homem.
b)A História da Humanidade é produto do homem em sociedade
c)A história da Humanidade é produto do talento do governante somado a sociedade.
d)Todas as respostas estão corretas.
3‐ Pode‐se afirmar que o método é o elemento fundamental na distinção entre o positivismo durkheimiano e o idealismo alemão?
a)Sim.
b)Não.
c)Ambos usam o mesmo método.
d)O principal elemento de distinção é o objeto de estudos.
4‐Para Émile Dürkheim o objeto de estudos da Sociologia é:
a) O fenômeno social.
b) O acontecimento social.
c) O "fato social".
d) A sociedade.
5 – Para Max Weber o objeto de estudos da Sociologia é :
a) A "ação social".
b) A"relação social".
c) A "ação e a relação social".
d) A"vida social".
6 – Na teoria weberiana tipo ideal é:
a) Um modelo de análise.
b) Um modelo de análise que possibilita ao pesquisador aproximar‐se da
realidade.
c) Um tipo de método.
d) Um tipo de objeto.
7 – O lema da bandeira brasileira "Ordem e Progresso" inspiraram‐se:
a) Na Revolução Francesa.
b) Na filosofia positivista de Augusto Comte.
c) No marxismo.
d) No idealismo alemão.
8 – O conceito de mais‐valia é um conceito chave na teoria marxista. Mais‐valia é:
a) O valor da mercadoria.
b) O número de horas a mais trabalhadas pelo trabalhador para produzir o seu salário.
c) O valor do trabalho.
d) O valor do capital.
9 – O que Marx entende por alienação?
a) Perda da capacidade de pensar logicamente.
b) Separação entre o trabalhador e os meios de produção.
c)Trabalho mecânico.
d) Trabalho artesanal.
10 – Que classes sociais Karl Marx identifica ao longo da história?
a) Nobreza e burguesia
b) Burguesia e clero
c) Nobreza, burguesia e clero.
d) Burguesia e proletariado
11 – Para Karl Marx a sociedade humana é fruto de um processo constante de transformações sociais provocadas por um determinado fator:
a) As guerras.
b) A luta de classes.
c) As invenções científicas.
d) As disputas políticas.
13 – O ser humano busca no trabalho:
a) Status social
b).Ganhar dinheiro e enriquecer
c). Receber um salário que permita a sua sobrevivência
d) Receber um salário que garanta a sua sobrevivência e ainda sentir que seu trabalho é útil à sua família e a sociedade em geral.
14.‐Considerando os versos sublinhados, assinale as repostas que nos permitem relacionar a música de Gonzaguinha ao que estudamos sobre a questão: homem/trabalho nas pesquisas de Elton Mayo?
Um Homem Também Chora (guerreiro Menino)
Gonzaguinha
Um homem também chora
Menina morena
Também deseja colo
Palavras amenas
Precisa de carinho
Precisa de ternura
Precisa de um abraço
Da própria candura
Guerreiros são pessoas
tão fortes, tão frágeis
Guerreiros são meninos
No fundo do peito
Precisam de um descanso
Precisam de um remanso
Precisam de um sono
Que os tornem refeitos
É triste ver meu homem
Guerreiro menino
Com a barra de seu tempo
Por sobre seus ombros
Eu vejo que ele berra
Eu vejo que ele sangra
A dor que tem no peito
Pois ama e ama
Um homem se humilha
Se castram seu sonho
Seu sonho é sua vida
E vida é trabalho
E sem o seu trabalho
Um homem não tem honra
E sem a sua honra
Se morre, se mata
Não dá pra ser feliz
Não dá pra ser feliz

Sociologia - EXERCÍCIOS DE SOCIOLOGIA TERCEIRO ANO

1)Caracterize as origens do fordismo, explicando-o.Embora o uso das máquinas no processo produtivo fosse significativo desde a década de 1890, somente na década de 1910, na fábrica da Ford em Detroit-USA, surgiu um sistema que gerenciasse de maneira mais produtiva o trabalho, a partir do taylorismo, surgido ainda no século anterior.

2)Como os avanços tecnológicos dos Pós-Guerra se relacionam com o fordismo?No após guerra, as mudanças e inovações surgidas por ocasião da Guerra se transformaram em produtos de uso civil. Deste modo surgiram o rádio, a televisão, as calculadoras e mesmo os carros, os quais passaram a ser produzidos e consumidos em massa.

3)Como era a organização da produção no fordismo?Longas esteiras, em grandes fábricas com grande número de trabalhadores, produziam em série, mercadorias para o consumo em massa.

4)O que era a produção em série e a produção em massa?A produção em série é a produção continuada e ininterrupta na linha de montagem; a produção em massa é a produção de um grande número de unidades de um mesmo produto, para mercados de massa.

5)Por que as indústrias fordistas trabalham com grandes estoques e grade número de trabalhadores?Os grandes estoques e grande número de trabalhadores eram utilizados para que a produção _para os mercados de massa_ não desacelerasse.

6)O que é o taylorismo? Quais são suas principais características?O taylorismo, método de gerenciamento do trabalho surgido ns finais do século XIX, se apoiava em três premissas básicas:SEPARAÇÃO: entre a concepção e a hierarquização do trabalho.SUBDVISÃO: do trabalho em porções iguais e repetitivas.HIERARQUIZAÇÃO: dos trabalhadores, com distinção clara entre chefia e operários.

7)Fale sobre a organização dos trabalhadores no fordismo.Os trabalhadores eram divididos basicamente em dois grupos: um de operários qualificados, que faziam trabalho especializado e outro de não qualificados, que realizavam o trabalho pesado. Além disso, os sindicatos se fortaleceram e os trabalhadores, organizados, conseguiram importantes conquistas sociais.Caracterize o consumo fordista.A característica mais marcante do consumo fordista, para além do consumo de massa, foi a expansão mercados internos, motivados pela expansão da massa salarial, a qual cresceu tanto pelas conquistas dos trabalhadores junto as empresas, quanto pelas ações do Estado, que ao ofertarem uma série de benefícios sócias, diminuíram a necessidade de poupança, favorecendo o consumo.

8)Qual o papel do Estado no fordismo? Por que o estado é pressionado a cumprir este papel?A ampliação do papel d Estado no período fordista se manifestou de duas formas principais: seja favorecendo os consumidores com políticas sociais diretas (aposentadorias, saúde, educação...) através do Welfare State [Estado do Bem-Estar Social] seja através de políticas de intervenção direta na economia, com a construção de infra-estrutura, atuação direta e planos de desenvolvimento regional e diminuição de desigualdades sociais.

9)Por que o Estado do Bem Estar Social (Welfare State) resultava antes de uma necessidade do capitalismo que de uma pressão do socialismo?As políticas de diminuição da desigualdade social e ofertamento de serviços público resultou na necessidade do fordismo de que o mercado consumidor se ampliasse; assim, essas políticas não visavam criar cidadãos, mas consumidores.

10)Como as políticas econômicas keynesianas se relacionavam com o fordismo?O Estado nacional de caráter keyneisiano passou a interferir mais diretamente na economia, por meio, por exemplo, dos gastos públicos, dos planos de desenvolvimento regional, da criação de um número significativo de empregos no setor público e do atendimento às garantias reivindicadas pelos trabalhadores, a exemplo da garantia de emprego. Também desenvolveu políticas destinadas a reduzir as desigualdades sociais, como as de transportes urbanos, habitação, saneamento, urbanização, educação e saúde.

11)Como se organizava o território no fordismo?O processo de urbanização acelerou-se, as cidades se transformaram em grandes manchas urbanas e as redes urbanas tornaram-se mais densas. A geografia do fordismo foi a das grandes concentrações urbano-industriais.

12)Que relação tem o surgimento das metrópoles e megalópoles com o fordismo?As metrópoles e as megalópoles com o objetivo de, ao reunir grandes massas de pessoas, reunir também consumidores e funcionários, de modo a favorecer o consumo

13)Quando e como o fordismo entra em decadência?O fordismo dependia do consumo de massa e de volumes salariais crescentes; no entanto, os salários não podiam crescer aponto de ameaçar os lucros empresariais; mantiveram-se os níveis salariais e os lucros aumentando os preços dos produtos, o que gerou uma crise inflacionária. Nos Estados Unidos, os gastos públicos se agigantaram, tanto interna como externamente - a guerra do Vietnã foi um exemplo. A moeda americana ficou debilitada e os produtos japoneses passaram a concorrer no mercado interno estado-unidense. Como os mercados internos eram a ênfase do fordismo, sua contínua perda para os japoneses significou a ruína do fordismo.

14)Diga as mudanças que ocorreram devido a crise do fordismo.A partir da década de 1970, a saída foi investir num novo modelo que rompesse com aquilo que era considerado a rigidez do modelo fordista. A ordem era flexibilizar, ou seja, golpear a rigidez nos processos de produção, nas formas de ocupação da força de trabalho, nas garantias trabalhistas e nos mercados de massa, então saturados. As empresas multinacionais, para restabelecer sua rentabilidade, expandiram espacialmente sua produção por continentes inteiros. Surgiram novos países industrializados. Os mercados externos cresceram mais que os mercados internos.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Sociologia - A violência urbana

Tentativa de definição
Depois que as insurreições raciais agitaram as grandes cidades americanas em 1968, o sociólogo afro-americano Kenneth Clark declarou à comissão de Kerner reunida a pedido do presidente americano Lyndon Baines Johnson: « Eu leio este relatório de motins em Chicago de 1919 e é como se eu lesse o relatório da Comissão de investigação das desordens no Harlem de 1935, o relatório de investigação daquelas de 1943, o relatório da Comissão McCone sobre os motins em Watts. Eu devo sinceramente lhes dizer, membros da Comissão, que se acreditaria em “Alice no País das Maravilhas”, com o mesmo filme que nos é eternamente passado: mesma analisa, mesmas recomendações, mesma inação » [1].
Esta intervenção já datada destaca três grandes características do que se chama « violência urbana »:
Sua antigüidade relativa, como nos Estados Unidos da América.
Sua irrupção esporádica em períodos e em cidades diferentes.
A incapacidade aparente das autoridades para compreendê-las, e assim combatê-las.
Se a primeira característica deve ajudar os historiadores a defini-la, elas parecem imperceptíveis no exame das duas outras, seu caráter eminentemente eruptivo e os supostos erros das autoridades públicas em procurar delimitá-las, circunscrevê-las, impedem finalmente de definir com precisão o problema. Para contornar a dificuldade de delimitação do objeto e evitar o longo prazo de análise, os autores fazem conseqüentemente recurso a uma definição limitada do fenômeno que corresponde somente à sua forma mais recente, aquela que examina as últimas décadas, menos, os últimos anos. Assim Sophie Body-Gendrot, afirma que o termo « violência urbana » indica « ações ligeiramente organizadas de jovens que agem coletivamente contra os bens e as pessoas, generalmente ligadas às instituições, em territórios desqualificados ou prejudicados” »[2]. É a definição que se pode reter sabendo bem que ela é restritiva, e que tende, por exemplo, a naturalizar as pesadas variáveis que pesam nos atores que agem com violência, notadamente a juventude, uma variável que não é que pouco questionada pelos especialistas. É entretanto uma definição eficaz no sentido que não se pode por razões de concisão, ter toda ação violenta perpetrada num quadro urbano ser considerada « uma violência urbana », mesmo se este deslizamento for às vezes necessário.
A interiorização da violência pela urbanização
A violência em geral cobre uma diversidade de comportamentos ou atos individuais, interpessoais ou mesmo coletivos. De uma época como de uma sociedade à outra, como recordado pelo filósofo Yves Michaud, as formas de violência empregadas e sua intensidade variam muito. Falaríamos hoje, por exemplo, de uma « violência na estrada » ou de uma « insegurança no trânsito ». Mas não é tudo, nossa sensibilidade a estas formas de violência mudou. [3] Segundo o autor, as normas aumentaram. Assim, comportamentos violentos passados outrora pelo silêncio como o mau trato infantil ou as violências conjugais são hoje denunciadas: a violência circulando na esfera familial é assim particularmente recente. Tudo isto explica, sempre segundo Yves Michaud, a extensão da incriminação no direito penal. Num mesmo movimento, o direito penal vê sempre mais a violência como não sendo necessariamente propriamente física: o que implica a atualização da noção de « vias de fato » à categoria mais antiga de « golpes e feridas ».
Para explicar a sensibilização maior quanto à violência, nós podemos recorrer à célebre teoria da « civilização das maneiras » segundo a qual o Ocidente teria conhecido a partir da Idade Média um longo processo de polissagem das maneiras: os conflitos que antes se exprimiam em afrontamentos sangrantes tenderam de mais em mais a serem interiorizados, por exemplo, via o esporte[4]. Segundo Norbert Elias, o promotor da dita teoria, esta evolução não é mais imputável a um simples crescimento do "self control", mas à sua generalização à todos os setores da vida pública ou privada sob impulsos de vários fatores tais quais a escolarização, a difusão dos códigos de corte e, enfim, a urbanização. A cidade é aqui reputada estar na origem da interiorização de sua violência pelo homem: a evolução no seio das massas a impôs mais retenção nos seus atos.
A repreensão da violência às margens da cidade
Seguindo Nobert Elias, o historiador Jean-Claude Chesnais sublinhou por sua vez o declínio tedencial da violência nas sociedades modernas, estudou entretanto somente a violência própriamente física. [5]. Mas outros historiadores vieram a contradizer esta idéia após a publicação dos trabalhos do historiador americano Tedd Gurr, realizadas nos anos 1970-1980, e que interpretaram a violência em termo de privação: ela se desenvolveria quando a elevação das aspirações dos indivíduos não se acompanhava mais de uma melhora comparável de sua qualidade de vida. É o que teria acontecido com as sociedades ocidentais à partir dos anos 30, década na qual Ted Gurr observa uma reversão completa da tendência, isto é, um aumento agora durável da violência, do homicídio, da criminalidade, dos roubos ou da delinqüência, seguindo uma curva em J. A tese de Ted Gurr é às vezes evocada pelo nome de « teoria da curva em J » por esta razão. Na França, segundo Sebastian Roché, esta escalada continua a se observar a partir da metade dos anos 50. Ela é independente, segundo ele, do contexto econômico : « A delinqüência aumenta particularmente durante os anos de reconstrução e de prosperidade. Depois da metade dos anos 80, ela tende a se estagnar, e isto apesar do aumento do desemprego de longa duração e dos fenômenos de exclusão »[6]. Mesmo se este diagrama é ele-mesmo controverso, é importante tê-lo na cabeça durante o estudo das violências urbanas propriamente ditas, que apresentam uma evolução diferente.
Anteriormente, devemos nos recordar que um dos princípios da organização da cidade sempre foi pensado como o recuo da violência para fora de seus muros; em oposição à campanha ao redor, uma campanha considerada o lugar de todas as jaqueiras e pilhagens, uma campanha onde o movimento de pacificação ocorreu tardiamente[7], o que explica o êxodo rural maciço para « esta tênue luz libertária do anonimato » [8]das cidades, de acordo com a expressão da historiadora Elisabeth Claverie. É necessário ver contudo, que este anonimato é ambivalente porque também é uma condição de existência de todas as espécies de tráfegos quem podem finalmente contribuir para a violência da cidade.
Seja como for, como observa por exemplo Michel Foucault em "Vigiar e punir", os grandes complexos industriais europeus foram construídos na orla das cidades para prevenir as revoltas operárias. Do mesmo modo, nos Estados Unidos, os campus foram construídos fora das cidades para afastar a ameaça estudantil… As populações mais demunidas em busca de trabalho s'instalaram também nos subúrbios. Ora, no inconsciente coletivo, o subúrbio continua por excelência o lugar à margem, aquele que acolheria marginais, bárbaros, em outros termos zulus, para retomar um vocábulo idôneo: a partir da Idade Média, o subúrbio é este espaço que se situa a uma milha da cidade e onde cessa o desterro, ou seja, o poder senhoril; este espaço para além do qual não se faz mais parte da Cidade e, por conseguinte da civilização[9]... As violências “urbanas” não são, por assim dizer, mais do que violências suburbanas; em todo caso, excluem-se da definição as violências perpetuadas no seio das manifestações que reivindicam quanto a elas logicamente uma maior visibilidade no centro da cidade: a violência se encontra no coração mesmo da cidade pelo fato que esta ultima é o centro do poder político a derrubar. Para o político, que é tentado a pensar a violência como contagiosa[10], esta aposta na segregação poderia finalmente ser feliz.
O aparecimento da violência urbana e conexões

Um automóvel incendiado na França em 2005.
Apesar da repressão de todos os tempos, a cidade tem sido sempre palco de violência. Assim, em uma carta dirigida ao prefeito de Londres 1730, o escritor Daniel Defoe reclamava que « os cidadãos não mais se sentem seguros em suas próprias casas, nem sequer atravessando as ruas »[11]. As « violências urbanas » tal qual nós tivemos definido aparecem claramente nos Estados Unidos por volta dos anos 60, na França, no início dos anos 80. Na seqüência destes incidentes, as violências urbanas serão regularmente perpetradas, mas em escala menor (como o vandalismo e, a partir dos anos 80, o hooliganismo por exemplo), tornando-se quotidiana e assumindo diferentes formas, tanto contra a propriedade quanto contra as pessoas, elas podem ser físicas ou simbólicas; erupções ocorrendo ocasionalmente como em 2005 por toda a França.
A violência urbana ocorre na maioria das sociedades modernas. No entanto, as manifestações como as causas da violência variam entre as sociedades, assim, é errôneo acreditar que a violência urbana que assistimos num determinado lugar seja apenas a transposição de situações de um outro espaço[12].
As causas do aparecimento das violências urbanas

Grafites à Viena, na Áustria.
Se os focos de violência urbana são frequentemente desencadeado por rumores de abuso policial ou algum abuso de autoridade, as degradações e agressões cometidas geralmente por jovens no espaço da cidade apresentam varias causas cruzadas que muitas vezes tornam-se seus resultados numa série de círculos viciosos engrenando o empobrecimento:
Uma situação familiar crítica. Onde a liberação do controle parental sobre a juventude implica numa falta de vigilância e punição aos contravenantes da ordem e das regras da sociedade; a eficácia da fiscalização pelos vizinhos ou pela comunidade ou mesmo pela sociedade não remedia que parcialmente esse problema.
A reprovação escolar, que pode ela mesmo decorrer da crise familiar. Assim, nos dias de hoje, a violência nas escolas é o rejeito mesmo da instituição, sobretudo pelos reprovados que reprovam as humilhações subidas. A comunhão de alunos em deficiência escolar com os outros implica a contaminação dessas deficiências e uma redução da qualidade no ensino em geral.
O desemprego, que se alimenta da falência da escola. Si ele pode engendrar a violência, esta o favorece em retorno, criando mecanismos de discriminação ao emprego ou, simplesmente, destruindo os bens que servem a criar o valor-agregado e, assim, os empregos.
O desenvolvimento de uma economia paralela, incluindo o tráfico de drogas e o comércio de mercadorias roubadas. A concorrência entre gangs ou organizações criminosas favorisou a circulação de armas.
A ausência de mobilidade geográfica dos mais demunidos. Ela tende à acentuar ao fio da partida dos mais fortunados uma cisão geográfica inelutável, eventualmente reforçada no dia à dia por um fraco serviço de transportes públicos. A exigüidade das moradias nas quais eles são condenados a viver (às vezes com uma família numerosa) empurram os jovens a tentar se apropriar do espaço público atenante, à procurar à controlar os grandes espaços monóicos como as ruas e os lugares de passagem estratégicas. Uma vez esses territórios conquistados, eles operam a uma verdadeira marcação, "tags" ou grafitagem por exemplo, mas também à um controle mais stricto, pela medida de pagamentos ilícitos de bens público ou privados, chamadas de « taxas », que é um termo de direito financeiro que faz referência ao monopólio estatal de cobrar impostos.
As praticas ditas desviantes como a toxicomania[13], pratica que necessita a instalação do tráfico pelo qual a proteção exige o recurso à violência.
O consumo da violência pela televisão ou jogo video.
A falta de influencia política[14] e a sous-mediatisação[15], que força o recurso à violência para se fazer entender. A violência e a força não são então que um repertório de ações que procedem a avantaje de serem mobilizáveis a todo o momento.
Os conflitos religiosos, os refúgios comunitários (o anti-semitismo no islamismo, por exemplo)
A discriminação racial e as rivalidades éticas.
A estas explicações clássicas adicionam-se causas culturais[16]:
Uma crise da masculinidade, que esta ligada à mecanização do trabalho que desvalorizou a força física. Ela favorisa as violências sexuais; violência e virilidade estão aqui associadas.
Nos países de imigração, o rompimento com os laços culturais e uma má integração ocasionada pela busca de reconhecimento e justiça são fatores de estímulo à violência. A desintegração de comunidades pode levar ao rompimento com a sociedade.
As dificuldades de intervenção frente à violência urbana ela-mesmo
Na medida em que o Estado se define no sentido weberiano como uma empresa de monopolização da violência física e legítima, a irrupção das « violências urbanas » é particularmente grave do ponto de vista do político: ela põe em dúvida a capacidade das instituições estatais a defender seus cidadãos, que é a base do pacto social, a promessa do Estado. Isto é tanto mais verdade que o monopólio da violência do Estado seria atacado de todos os lados. Assim, de acordo com Sebastian Roché, o aumento da violência que se conhece desde o pós-guerra não é imputável a uma categoria específica de indivíduos, mas a uma generalização dos comportamentos agressivos nas diferentes camadas da população. De acordo com ele, observações, por exemplo, revelaram que bons alunos também praticam o "racket" (extorsão, roubo com violência) fora da escola.
De acordo com o sociólogo, o Estado deveria dar uma resposta nítida ao problema da violência das cidades se quiser continuar a ser credível. A solução oscilando entre repressão e prevenção. Esta segunda necessita em todo caso a intervenção de uma justiça forte. Ora, como observa Yves Michaud, a violência é uma noção muito pouca utilizada pelos juristas porque bastante vaga e mal definida. Ela necessita também, enquanto política pública, de uma avaliação eficaz, o que significa um instrumento estatístico eficaz. Ora, este apresentaria nomeadamente problemas, porque é utilizado por aqueles mesmos que têm interesse a manipulá-lo, o governo. É igualmente um problema se este instrumento não é estável no tempo.
Estes problemas podem ser contornados pela introdução de análises qualitativas das diferentes formas de violência urbana e de sua repreensão, no âmbito de programas específicos. Mas nem todas as violências são quantificáveis. Também, depois de alguns anos, inquéritos de vitimação são realizados para melhor apreender qualitativamente os fenômenos de violência. Consistem em interrogar as pessoas sobre os incidentes dos quais teriam sido vítimas e si elas teriam ou não os declarados à polícia. Estes inquéritos são antigos nos Estados Unidos. (International Crime of Victimization Survey)
Em todo caso, vários argumentos opõem-se aqui à idéia de um aumento recente das violências urbanas: a falta de fiabilidade ou mesmo existência de meios estatísticos, o fato de o aumento ser um melhor recolhimento das queixas pela polícia, ou mesmo uma maior sensibilidade dos indivíduos à violência, que os inclinaria a delatar mais facilmente crimes. Sinala-se também que os números permanecem médios que podem esconder fortes disparidades geográficas e sociais. De fato, mais que um aumento da violência, é a uma diversificação das vítimas e das instituições visadas que nós assistiríamos.
Em geral, atualmente a luta contra a violência urbana empresta várias formas:
O reforçamento da presença policial nas zonas sensíveis pela redistribuição dos efetivos e a redefinição dessas zonas, dois movimentos que podem acentuar involuntariamente a desestruturação dos espaços visados ou o sentimento de desestruturação. Polícias dotadas de melhores equipamentos pessoais podem fazer temer os jovens de um reforço do controle que pesa já sobre eles. Recorda-se à respeito, na seqüência de Michel Foucault, que a delinqüência é apenas uma evolução nas nossas sociedades que substitui antigas formas de ilegalidades que não podiam, quanto a elas, ser controladas a distância, de longe. Esta evolução opera-se por meio da aplicação de novos meios técnicos e tecnológicos de vigilância. Hoje, a maioria dos agitadores de desordem interpelados podem ser "conhecidos" da polícia pelo recidivismo.
Tentativas de discriminação positiva em prol de bairros desfavorizados.
A renovação urbana, mais ou menos importante em função dos países. Nos últimos dez anos, a Alemanha consagrou anualmente 3,5% do seu PIB à reunificação e à renovação urbana. Já a França (em 2003), esse esforço não representou mais do que 5,7 bilhões, ou seja, 0,36% de seu PIB.
A escolha de combater os efeitos da violência, notadamente o sentimento de insegurança
Contrariamente aos outros tipos de violências civis, as « violências urbanas » implica conseqüências para além das suas vítimas diretas. Como o menciona Yves Michaud, a nossa relação para com a realidade violenta não passa somente por parte dela pela experiência direta que temos: passa também doravante pelos testemunhos e as informações que recebemos, notadamente pela mídia, mas também pelas empresas de segurança quem têm também grande interesse à acentuar nossa percepção da violência, já que a segurança representa um mercado conseqüente. Assim cria-se essa situação paradoxal nas quais poucas pessoas afirmando sentir a insegurança foram elas mesmas atacadas. É o que se chama "sentimento de insegurança". Para uns, tal sentimento é o produto de fantasmas, em contradição com a baixa tendencial da violência nas sociedades modernas. Para outros, como Sebastian Roché, traduz ao contrário um aumento efetivo da delinqüência e da criminalidade, bem como de um fenômeno pouco levado em consideração há alguns anos: as incivilidades[17], cujo estudos não começaram nos Estados Unidos que nos anos 1970. A dificuldade vem das estatísticas que ignoram as incivilidades legais como a impolidez, etc.: interessam-se apenas às incivilidades ilícitas.
Do ponto de vista político, na medida onde ele concerne às massas, o sentimento de insegurança ligado às violências urbanas é talvez mais importante que a violência e a degradação elas-mesmas, pois ele é a primeira força que determina o voto securitário, além da violência real. O político procura assim à medi-lo, em seguida à fazê-lo eventualmente recuar, o que pode ocasionar problemas complexos: deve-se colocar as forças de polícia lá onde verdadeiramente ela é necessária ao risco de fazer temer um abandono do resto da população, ou ao contrário, as concentrar lá onde elas não jogam que um papel simbólico ao risco que a situação dos bairros abandonados torne-se incontrolável na sua relativa ausência? Resumidamente, a luta contra as violências urbanas compromete por conseguinte dois cursores cujos movimentos são parcialmente ligados, e apenas parcialmente: o primeiro o da violência real, o segundo da violência sentida. Baseando-se na democracia participativa, por exemplo, a política pública ideal na luta contra as violências urbanas seria uma mistura de ação e de representação que seria condenada à não ter um êxito que parcial.




Conclusão
Como afirma Yves Michaud, « a maioria das sociedades comporta subgrupos onde o nível de violência é sem medida com aquele da sociedade ou, ao menos, com as avaliações comuns que prevalecem lá: tal é o caso dos grupos militares, das gangs de jovens ou das equipes esportivas ». Tal é também o caso dos jovens que produzem a violência urbana tal como definido acima. Nos grupos que formam esses jovens, a violência mesma seria a norma: ver-se-ia bem lá ter feito a prisão. Essa passagem credibilisaria o indivíduo e, assim fazendo, o permitiria de não mais fazer recurso à violência física direta para ser respeitado. Nesses casos de inversão da norma, mesmo as lutas de poder no seio de um mesmo grupo também são lutas violentas, e isso porta enormes conseqüências no espaço circunvizinho, que é também aquele dos terceiros: na cidade, nos espaços públicos, nos transportes urbanos, etc.
As vítimas diretas ou indiretas dessas violências sofrem frequentemente menos com a dor infligida que com a sua incapacidade a reagir de maneira apropriada à violência que é involuntariamente imposta, isto é, geralmente, pela violência. Assim, a maioria dos traumatismos de que sofrem aqueles que após terem sido agredidos de uma maneira ou de outra, releva de fato a sua lealdade extrema no que diz respeito ao estado, o qual vem se juntar à eles afim de não ceder à violência mesmo quando esta se impõem. Pode-se requerer então das autoridades em retorno à aquilo que eles ressentem como um sacrifício, um reconhecimento que os possa instituir como vítimas, vítimas eventuais qualificadas à falar e agir contra a fonte de violência que lhes a alcançou. Seria lá o desafio último que a violência urbana oferece às autoridades públicas. Degradando a qualidade de vida de todos, elas transformariam cada um em produtor de queixas às quais as autoridades terão cedo ou tarde que responder se elas não quiserem perder a confiança de seus cidadãos e suas obediências.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Sociologia - Violência, juventude e marginalização

Introdução
A exposição das pessoas ao risco constante de ataques a sua integridade física e moral gera expectativas nas mesmas e, fornece-lhes padrões de respostas. Episódios truculentos e situações limites passam a ser imaginados e repetidos, como uma maneira de preparar o psiquismo para a idéia de que só a força resolve conflitos, tornando a violência um item obrigatório na visão do mundo que nos é transmitida. Cria-se a convicção tácita de que o crime e a brutalidade são inevitáveis, e que a pessoa deve estar preparada para eles e para reagir em conformidade. Esta familiarização com a violência, torna-a nosso cotidiano, um acontecimento corriqueiro, cuja proliferação indiscriminada mostra que as leis perderam o poder normativo e os meios legais de coerção, a força que deveriam ter e, nesta lacuna, vicejam, indivíduos e grupos que passam a arbitrar o que é justo ou injusto, segundo visões privadas, dissociadas de princípios éticos validos para todos. O crime é, assim, relativizado em seu valor de infração e os criminosos, ao invés de se sentirem marginais, agem com tranqüilidade, não se julgando fora da lei ou da moral, pois se conduzem de acordo com o que estipulam ser o preceito correto. Disseminam-se "sistemas morais" particularizados, que "legalizam" os atos praticados dentro da ótica moral e ética própria, podendo nelas uma atitude criminosa ser justificada e legitima.
Sabemos que não existe "moral relativa", do ponto de vista de quem a professa, Crença ética é aquela que exige do sujeito uma posição quanto ao certo e ao errado e, no momento em que há duvida sobre o certo e o errado de certa ação, se está alterando os sistemas de crença. Ou seja, o justo e o injusto, o violento e o não violento, o humano e o desumano dispensam fundamentos racionais para determinar o modo como agimos e avaliamos nossas ações. Daí a dificuldade que enfrentamos quando tentamos convencer indivíduos adeptos da violência de que o recurso aos meios legítimos da justiça ainda é o melhor meio que temos de eliminar conflitos.
Em segundo lugar, a cultura da violência, valorizando a utilização da força, constrói uma nova hierarquia moral. O universo social simplifica-se monstruosamente entre fortes e fracos. Quem ocupa a posição de agressor é objeto de temor e ódio por parte da vitima e quem ocupa a posição de vitima é objeto de desprezo e indiferença por parte do agressor. Pouco importam as características físicas, psíquicas ou sociais dos sujeitos. Na montagem violenta o que conta é a força ou a fraqueza de quem ataca e de quem se defende. Nestas circunstancias os apelos humanitários caem no vazio. A lógica da brutalidade nivela por baixo os sentimentos. Termos como compaixão, consideração, culpa ou responsabilidade diante do semelhante desaparecem do vocabulário. A dificuldade de ultrapassar esse tipo de barreira emocional é uma das razões pelas quais se pode assassinar menores, desconsiderando o fato de que são crianças que estão sendo assassinadas.
Em terceiro lugar,na montagem social violenta perde-se pouco a pouco a noção do que é risco real ou potencial. A expectativa do perigo eminente faz com que as vitimas potenciais aceitem facilmente a sugestão ou a pratica da punição ou do extermínio preventivo dos supostos agressores potenciais. Todos se sentem vulneráveis, todos buscam atacar primeiro, todos vivem sob o temor da represália. O clima de insegurança e o vivido persecutório generalizam-se.
Juventude, violência e crime
Alguns anos atrás, a sociedade surpreendeu-se ao descobrir que o crime organizado do Rio de Janeiro, usava as crianças das favelas como "olheiros", dando aviso da aproximação da policia com rojões ou empinando pipas. Mais tarde, sabendo que o Comando Vermelho havia constituído grupos de adolescentes na faixa etária entre 12 e 17 anos, usando-os como "soldados" nos esquadrões de segurança do tráfico, encarregados de tarefas antes confiadas aos adultos, tais como a proteção das "bocas de fumo" e pontos de venda de cocaína, barreiras em ruas e avenidas, patrulhamento das áreas das favelas, o "justiçamento" de delatores e de inimigos e, até, confrontos diretos com policiais, a surpresa tornou-se espanto e revolta.
Acirraram-se as discussões sobre a questão da violência juvenil e as possíveis soluções para a mesma mas, estas enveredam pelo caminho da simplificação inócua: penas mais duras e redução da idade penal. Obviamente, este não é o caminho.
De fato, em uma sociedade em que meninos de oito anos desempenham cargos de vigia ou "avião" dos esquemas de trafico das favelas e morros dominados pelos criminosos, recebendo gratificações que chegam a superar os salários mensais de seus pais, o caminho natural destas crianças é, ao tornarem-se adolescentes, subirem na escala hierárquica do crime, galgando cargos e encargos mais importantes na mesma.
As quadrilhas são, obviamente, parte integrante e preponderante da vida dessas comunidades pobres da periferia, esquecidas pelos poderes públicos, tendo como única presença efetiva dos mesmos naquelas áreas apenas a policia, com toda a carga negativa que esta historicamente representa para as classes menos favorecidas. O poder publico, em tais regiões, parece isentar-se de seu dever como agente cooptador de recursos, de programas sociais, obras de infra estrutura, dentre outras, deixando brechas sociais, que são aproveitadas pelas organizações criminosas para atuarem nessas comunidades como benfeitores, suprimindo uma responsabilidade do Estado. Nestas, graças à astuta e calculada atitude adotada pelos dirigentes, o jovem favelado encontra dinheiro, fraternidade, respeito e ascensão social no ambiente onde vive, tornando-se "alguém" na sociedade local, embora para a sociedade em geral passe a ser um marginal.
Suportes sociais do crime nas comunidades carentes.
A crença de que o controle do crime organizado sobre as comunidades onde se instala é baseada apenas na pressão e intimidação que exerce com o seu poder armado é fácil e cômoda mas, não é verdadeira. Embora realmente conte com um grande "poder de fogo", constituído por armamentos modernos e de alta qualidade, dificilmente superado, ou até mesmo igualado, pelas organizações policiais e, de uma tropa paramilitar considerável (estima-se que no Rio de Janeiro, onde finalmente se admite a existência de um "governo paralelo", apenas o Comando Vermelho possui 12.500 homens em armas, defendendo seus mais de 2000 pontos de venda), o crime organizado, arrima-se em outros dois elementos, tão ou mais importantes quanto a força armada, para determinar a supremacia criminosa.
O primeiro, o poder corruptor, cuja força e atividade são conhecidas a séculos, agindo sempre como um "quinta coluna" dentre as hostes do combate ao crime, e que coloca em cheque todo o aparato político-policial-judicial do Estado e a própria sociedade, agindo de maneira silenciosa e subterrânea, criando áreas de impunidade e invulnerabilidade. Deve-se entender como corrupção não apenas o suborno em espécie, a propina que o traficante distribui a políticos, policiais ou juizes para facilitar sua liberação ou dos seus comparsas mas, também, o favor que é feito ao morador do bairro, a praça de esportes doada à Associação do bairro, as festas e bailes, a ajuda para comprar o gás, a cesta básica ou o caixão. Esta corrupção social apresenta-se, realmente, como o pior tipo de corrupção pois, enquanto na outra se compra e corrompe apenas o individuo, afasta-se o escrúpulo e a honestidade pessoal, nesta se corrompe e compra a própria sociedade, com a propina do beneficio à comunidade, que assim é levada a compactuar com a organização criminosa e a aceitar seus chefes e membros como benfeitores e cidadãos exemplares, tornando-se praticamente cúmplice dos criminosos..
O segundo se trata do componente social, esquecido quase sempre mas, sobremaneira importante para a composição da proteção da comunidade ao bandido. As quadrilhas nascem no seio destas comunidades, e o "soldado", o "olheiro", o "gerente da boca", até o próprio chefe do tráfico na área, são filhos, irmãos, namorados, maridos, ou tem qualquer outro grau de parentesco ou amizade com alguém da favela, geralmente tendo sido criados na mesma, sendo modelo e inspiração para os mais novos. Kemal (1) cita que, " Os bandidos vivem de amor e de medo. Inspirar apenas amor é fraqueza. Quando inspiram apenas medo, são odiados e não tem quem os ajude"
Ora, a ascensão social através do mundo do crime é o caminho, aparentemente certo e fácil, que se apresenta para o jovem favelado, socialmente excluído pela sociedade de consumo do chamado "mundo do asfalto" e, os chefes das organizações, reconhecendo o valor deste sangue jovem, procuram incentiva-los e iludi-los, com a demonstração do status de que desfrutam na comunidade, o poder que exercem de maneira absoluta, determinando a vida e a morte e, principalmente, o usufruto das benesses do consumismo capitalista. Fácil, portanto, seduzir um jovem carente que possui como seu sonho de consumo a posse de um tênis "maneiro", roupas de grife, carro e outras utilidades, mostrando ao mesmo que o dinheiro do crime, embora não possa inseri-lo na sociedade "do asfalto", pode lhe dar um lugar de destaque na da favela. Esta é, de fato a grande "isca", que leva os jovens ao crime.
Carência Famíliar e marginalização do jovem
Segundo Engels, o termo "família" é derivado de "famulus" (escravo domestico), expressão inventada pelos romanos para designar um novo organismo social que surgia entre as tribos latinas ao serem introduzidos à agricultura e à escravidão legal. Esse novo organismo caracterizava-se pela presença de um chefe, que mantinha sob seu controle a mulher, filhos e um certo número de escravos, com domínio de vida e morte sobre todos eles, o pater potestas. Desde então, o termo família tem designado instituições e agrupamentos sociais bastante diferentes, entre si, do ponto de vista de sua estrutura e funções. Tais grupos e instituições, ao longo da história, não tiveram necessariamente a reprodução cotidiana ou geracional como função especifica ou exclusiva e, em muitos momentos, desempenharam simultânea e prioritariamente, funções políticas e econômicas.
De modo geral, a família é unidade de reprodução social e, como tal, nas palavras de Bourdieu (2), "tem papel determinante na manutenção da ordem social, isto é, na reprodução da estrutura do espaço social". Segundo esse autor, a reprodução social representa a transmissão da herança familiar para os filhos mediante difusão de diversos tipos de capital distribuídos do seguinte modo:capital simbólico, capital econômico, capital cultural, capital social e capital escolar, processo por meio do qual se estabelecem vínculos entre gerações. Adotou-se, entretanto, como verdade estabelecida, um modelo familiar baseado na subordinação, poder e obediência, com a autoridade masculina no topo e conseqüentes relações desiguais. Fixou-se o mundo externo como espaço masculino e a casa, como feminino, tendo o homem o papel de mantenedor da família. Ora, esta, entretanto, não mais é a realidade, sendo que os papeis familiares foram embaralhados e trocados pela dinâmica social do século XX. Inobstante, a situação de fato não é bem aceita pela sociedade, que mantém os mesmos padrões anteriores, estandartizando a família no modelo antigo.
Assim, fora desse contexto socialmente aceito, as famílias são consideradas "incompletas" e "desestruturadas" e, responsabilizadas por problemas emocionais, desvios de comportamento do tipo delinquencial. Este modelo imposto pelo discurso das instituições, da mídia e, até mesmo, de profissionais, que é apresentado não só como o "certo" de se viver em família, mas também como valor, é aceito e inquestionado, sendo indiretamente transmitido e captado, o discurso implícito de incompetência e de inferioridade daqueles que não "conseguem" viver de acordo com o modelo. Ao interiorizar esses valores e modelo de organização e conivência as pessoas que não se enquadram neste protótipo tem uma certa tendência a isentar-se do processo de participação por sentirem-se inferiores e incompetentes em relação àquelas que compõem as instituições.
A desqualificação profissional dos pais, geralmente analfabetos, leva-os a serem inseridos na categoria de trabalhadores com baixa remuneração ou sem remuneração fixa, tornando-os, conseqüentemente, não consumidores, numa sociedade que leva em conta o que e o quanto você consome como parâmetro para fixar sua existência e posição social. Esta marginalização dos pais, estigmatiza o jovem, transformando-o em um rejeitado, tanto pela sociedade, que vê nele alguém que não pode consumir, e portanto não existe, quanto pela própria família, que o tem apenas como "mais uma boca" dentro de casa. Como diz CHENIAUX (3) , o jovem, se não contribui para o orçamento familiar com o seu trabalho, passa contribuir com sua ausência, com o que concorda Espinheira (4), "com os baixos salários e o desemprego, as crianças e adolescentes são lançados no mercado informal de trabalho e outros tantos são expulsos ou se exilam de seus familiares por não suportarem a miséria..."
O jovem excluído pela marginalização familiar na sociedade de consumo, passa a ver que a sociedade espera que ele seja um criminoso, por que já o considera um criminoso, devido à sua origem e sua impossibilidade de inserir-se no mercado consumidor, como também adverte Espinheira (5), "Vistos como marginais, disso tem consciência e por isso reafirmam-se como tais, correspondendo em imagem e gestos a forma como são percebidos.". Inicia-se o processo que pode levar o jovem à violência criminosa, passando o mesmo a nutrir sentimentos de revolta e vingança social, terreno fértil e propicio para medrar a semente plantada pelos quadrilheiros, já que, estudos tem demonstrado haver uma ligação direta entre o sentimento de débito social, que lhes é passado pela família e pela própria sociedade, e a violência.
O lado perverso da invulnerabilidade legal
A inimputabilidade legal, que torna o jovem quase inatingível para a policia e o judiciário, transforma-o no "soldado" ideal para o crime organizado, tanto assim que o efetivo de segurança das quadrilhas passou a ser integrado por adolescentes, ágeis fisicamente, destemidos, audaciosos, procurando firmar-se na sociedade e, por isso mesmo, capazes de cometer os mais temerários atos, sem mensurar conseqüências. Se "caírem em combate", podem ser facilmente substituídos e, se forem presos, são recolhidos a instituições especiais de onde, quando não fogem facilmente dias depois, são liberados em pouco tempo e devolvidos as ruas, para continuar o "serviço". A pratica, tem demonstrado que a permanência do jovem nestas instituições é tão inócua quanto a pretensão de que as mesmas sejam locais de "reeducação". Tais instituições são absolutamente ineficazes, face às costumeiras carências infra-estruturais próprias da administração pública, para o fim a que deveriam se destinar, tornando-se, de fato, meros "depósitos humanos" que servem apenas para que os jovens sejam "educados" e "aperfeiçoados" no crime, enquanto aguardam sua volta às ruas..
Obviamente, as vantagens desta mão de obra barata, volumosa e, melhor ainda, impune, são tão grandes que os chefes do crime buscam arregimentar e criar seus grupos desde a idade de sete ou oito anos, incluindo estas crianças no "organograma" da quadrilha, onde poderão prosperar.
Mas, por outro lado, se o torna atraente e cobiçado pelo crime, o escudo protetor legal também expõe o jovem à violência institucional, à sanha violenta e assassina da sociedade. Neste contexto, a presença do jovem no mundo do crime, a pratica de atos violentos que, para o cidadão comum, não são punidos devido ao escudo já referido, cria uma aversão social ao adolescente de rua, ainda que não seja ele infrator, e gera ainda maior marginalização do mesmo, culminando no ponto máximo com a tácita autorização social para o extermínio, sob a égide do venho adágio de que, "bandido bom é bandido morto".
Assim, indivíduos e grupos que, como dito acima, arrogam-se aos papeis de promotor, juiz e carrasco, passam a "justiçar" aqueles que, no seu entendimento, a "falida" legislação não pode alcançar. O extermínio de crianças e adolescentes pobres tornou-se um serio problema social, perpetrado por grupos especializados, em sua maioria constituídos por policiais a soldo de comerciantes mas, também por elementos movidos por sentimentos de vingança, que na maioria das vezes permanecem impunes, graças à hipocrisia da própria sociedade, que os condena em público mas, na sombra, aplaude e nada faz de efetivo para coibi-los e puni-los..
Conclusão
Como conceitua Adorno (6), (...) a violência é uma forma de relação social; está inexoravelmente atada ao modo pelo qual os homens produzem e reproduz suas condições sociais de existência.
As observações aqui efetuadas deixam claro que enquanto a discussão sobre o problema da violência juvenil girar apenas em torno da idade penal não se chegará a qualquer solução pois, não é a idade que torna o jovem mais ou menos violento mas, a carga social que ele e sua família são obrigados a suportar pela exclusão social, que os marginaliza e oprime. Penas privativas de liberdade maiores não são necessárias mas, é preciso que os estabelecimentos de internação passem a ser o que deles se espera e exige a lei, possibilitando a real regeneração do jovem, que muitas vezes entra nos mesmos pela primeira vez ainda em condições de livrar-se do tortuoso caminho do crime, em que a própria sociedade procura joga-lo. Também fica claro que a aura de impunidade legal que lhe é concedida por esta mesma sociedade que o execra, num inexplicável e tortuoso mecanismo de compensação, não o protege mas, ou o joga nos braços do crime ou, no do carrasco.
Assim, projetos sociais que busquem ajudar adolescentes e crianças pobres para evitar seu ingresso no crime e na violência, devem procurar auxiliar a família como um todo e não apenas um individuo pois, somente assim se garantirá que a juventude não continue a ser excluída e marginalizada.

Sociologia - Convivência: A arte perdida

Vivemos um período de grande violência urbana, onde cada vez mais as pessoas se voltam para as suas casas e para a convivência familiar. Ao contrário dos anos 70, quando toda a vida saía do núcleo familiar para a sociedade, para a independência da família, desde meados dos anos 90 as pessoas voltam para as suas casas, restringidos pela violência ou, em uma análise mais profunda, na busca de um "ninho".Então contestamos: na minha família, com tantos problemas que temos, é inconcebível que seja considerada um "ninho". Para contrapor esta afirmação, basta pensarmos quantas vezes discutimos com os nossos pais, com os nossos irmãos, com os nossos filhos e depois de algumas horas, de alguns dias, passa a raiva e o amor incondicional que aí existe volta a florescer. Isto não quer dizer que não encontremos defeitos nos outros. O problema, o que torna difícil qualquer convivência é quando só encontramos falhas no outro e esquecemos de olhar para nós mesmos, de enxergarmos os nossos próprios defeitos para nos trabalharmos e sermos cada dia melhores, mais virtuosos.Nesta convivência temos dois aspectos: primeiro as pessoas esqueceram o que é uma família; o papel de mãe, o papel de pai e o papel de filho. A idéia de direitos iguais trouxe uma convivência entre iguais, e numa convivência entre iguais falta o exemplo, falta o limite, falta a hierarquia dos papéis, necessários não só na família, mas em todos os aspectos sociais. Por exemplo, · mães excessivamente "abertas" deixam de transmitir a sensação de cuidado e aconchego; · pais que possibilitam a compra de todo o objeto desejado para alegrar o filho, depositam na aquisição o poder da felicidade, e impedem a vivência da frustração, tão comum a nossa vida;· filhos que não percebem o limite e a presença dos pais, sentem-se sem a segurança do lar e se "adultificam" para tomar o papel de pai ou de mãe. Com freqüência, estes serão os filhos que chamamos "mal-educados", que não respeitam os pais e que buscam na rua o diferente, ou até, uma segurança para si (mesmo que ilusória).Antigamente a casa era uma fortaleza, um lugar sagrado; os reis morriam para defender os seus castelos e hoje queremos "férias" do nosso lar. Por que? Porque dentro de casa temos que lidar com os nossos próprios "bichos" - não nos comportamos com interesses e então nos deparamos conosco. Assim como nós, o nosso familiar também é mais livre na expressão das emoções e aí vem à tona toda a angústia e os "sapos" que engolimos nas ruas e, manifestando e alimentando apenas aquilo que não queremos, as emoções mais negativas que vivemos no dia-a-dia, não conseguimos ver o que temos de bom. E se em casa, não conseguimos ver o que temos de bom, queremos tirar "férias" da casa.É neste ponto que a família, aparentemente, deixa de cumprir o seu papel de "ninho". É quando tornamos a convivência mais difícil por nos despirmos das máscaras de interesses sociais e aparências para, sem nos darmos conta, nos apegarmos a outras máscaras, de raiva, de inveja, de conflito, de angústia... Chamo esses sentimentos de máscaras, porque se fôssemos de fato olhar para dentro de nós mesmos, perceberíamos o amor que temos no nosso Eu mais profundo, escondido e talvez esquecido pelas circunstâncias da vida, mas que pode sempre ser o inspirador de uma convivência com arte, ou seja, mais bela, mais harmoniosa, geradora de vida e não de morte.

sábado, 4 de outubro de 2008

Sociologia - Autoritarismo e Autoridade

Há, no mundo moderno, um interesse cada vez maior pelas questões geradas pela violência, pela exclusão social e pelo desrespeito ao espaço público. Também na escola esse é um tema central, que preocupa professores e educadores em geral. Fala-se muito que esses problemas estariam ligados a uma ‘crise de autoridade’ na sociedade contemporânea. E, frequentemente, vemos, aqui e ali, alguém afirmar que a solução para esse quadro estaria na existência de um poder mais ‘autoritário’. É necessário discutir profundamente esse tema que atinge a todos. Mas é preciso sempre lembrar: autoridade não pode ser confundida com autoritarismo. Em nome dessa confusão, muitos erros foram e continuam a ser cometidos.A Europa, depois da Primeira Guerra Mundial, assistiu a um período de grandes conflitos. Os valores liberais (liberdade individual, política, religiosa, econômica) começaram a ser colocados em xeque, devido à impossibilidade dos governos fazerem frente às crises econômicas e sociais. O enorme desemprego, a miséria e a desesperança 'minaram' as conquistas democráticas que a sociedade vinha conseguindo.O nascimento do nazi-fascismo, que tanto se refere à doutrina da Itália fascista como à da Alemanha nazista, simbolizaram práticas políticas comprometidas com um regime autoritário, “símbolo da unidade, da força e da justiça”, segundo Benito Mussolini, ditador italiano, fundador do Partido Fascista.Na verdade, o Estado nazi-fascista é a formação de um tipo de Estado autoritário que surge de uma sociedade em crise, na qual a instabilidade aparece sempre como marca.Hoje, setenta anos depois, pode-se identificar na raiz do Estado autoritário fascista e nacional-socialista, os principais componentes de uma ideologia anti-democrática e percebe-se como o discurso do Estado centralizador levou o povo a perder o sentido de Nação e a ver o Estado como finalidade última. Mussolini dizia que “tudo está no Estado, nada contra o Estado, nada fora do Estado”.O resultado da reunião desses ingredientes foi a Segunda Guerra Mundial, com todos os seus horrores: vinte milhões de mortos, a Europa destruída e um mundo que se perguntava incrédulo como havia sido possível chegar-se a isso.As marcas do autoritarismo, que traumatizaram a sociedade humana, levaram os homens a lutar por formas cada vez mais democráticas de distribuição do poder. Contra as ideologias centralizadoras e autoritárias buscou-se criar organizações internacionais legítimas que pudessem garantir os direitos humanos e as liberdades civis, dentro de um Estado de direito.A tendência que se verificou no pós-guerra e que permanece até hoje no ideário democrático, malgrado algumas exceções, tem sido a busca, a construção de uma Nação na qual os cidadãos elegem seus governantes e participam da condução das questões nacionais através dos seus representantes nos Congressos Nacionais.A legitimidade, conferida pelo voto aos representantes do povo, confere-lhes também autoridade.Pode-se perceber, desde os anos finais do século XX, um interesse crescente da sociedade como um todo, e da educação em particular, por questões que passam pelos problemas causados pela violência, pelo arbítrio, pela exclusão e que estão ligados, sem dúvida, à questão da autoridade e da ética.Incluir essa discussão nos projetos pedagógicos das escolas, em qualquer nível, tem como objetivo a formação do cidadão, o que passa por promover mudanças sociais que devem vir acompanhadas de outras, destinadas a promover mudanças individuais. Segundo Yves de La Taille, isso significa creditar à educação a possibilidade de levar crianças e jovens a "construir valores, a pautar seus comportamentos por regras, a situar-se além e aquém de certos limites", mas a lutar, também, contra a violência, que não se deve somente à falta de valores de algumas pessoas, estando, antes, vinculada à pobreza, à injustiça, ao arbítrio, à exclusão.O papel da educação, seja aquela a cargo da família ou da escola, tem um duplo objetivo: levar crianças e jovens a transpor seus limites pessoais como ser humano, mas a partir de princípios éticos, morais, existenciais que são “normativos”, isto é, criados e impostos pela sociedade.A colocação de limites faz parte do processo educativo e a ausência dessa prática pode gerar uma crise de valores, uma volta ao estágio selvagem em que vale a lei do mais forte.São os pais e os professores, no caso específico da família e da escola, aqueles investidos de autoridade para colocar limites e reforçarem as tendências “pró-sociais” presentes em crianças e jovens, como de resto em todos os seres humanos.Assim, a função de educação, entre outras, é a de levar os educandos a perceberem o que podem ou não podem fazer, o que devem ou não devem fazer, numa dada situação.A autoridade dos pais e dos professores é fundamental para balizar os limites legítimos da consciência humana que devem ser apropriados por todos, inclusive pensando-se no futuro, quando essas crianças e jovens desempenharão o papel de educar outras crianças e jovens e, talvez, o de decidir os destinos da sociedade.Assim - quem sabe? - se estará possibilitando que possam chegar à maturidade, podendo usufruir de uma liberdade consciente.Autoritarismo e autoridade, entendidos nas duas dimensões aqui colocadas, são dois conceitos bastante diferentes. O Autoritarismo está ligado a arbítrio e a práticas anti-democráticas e anti-sociais. Autoridade ao contrário, refere-se a uma prática pró-social, que tem como objetivo levar o ser humano a perceber as normas colocadas pela sociedade, a julgar sua legitimidade e a avançar no sentido de tornar mas humana e mais democrática a vida em sociedade.
(Fundação Darcy Ribeiro)

Autoritarismo
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Ir para: navegação, pesquisaO autoritarismo é um regime político em que é postulado o princípio da autoridade. Esta é aplicada com freqüência em detrimento das liberdades individuais. Pode ser definido como um comportamento em que uma instituição ou pessoa se excede no exercício da autoridade de que lhe foi investida.
Pode ser caracterizado pelo uso do abuso de poder e da autoridade confundindo-se com o despotismo.
Nas relações humanas o autoritarismo pode se manifestar da vida nacional onde um déspota ou ditador age sobre milhões de cidadãos, até a vida familiar, onde existe a dominação de uma pessoa sobre outra através do poder financeiro, econômico ou pelo terror e coação.
Distinção entre autoritarismo e totalitarismo.
A distinção entre regime autoritário e totalitário é que no primeiro, o Governo não procura controlar a vida privada de seus cidadãos a ponto de torná-los, compulsoriamente, "reeducados" para passar o resto de suas vidas sob o regime.
Nos regimes autoritários da América Latina, havia forte repressão vinda de cima, contra os elementos reputados "dissidentes", mas a população civil era normalmente deixada em paz.
Nesse particular, o autoritarismo de Estado prefere alienar a população, fornecendo-lhe diversões públicas que as distraiam das preocupações políticas. Foi o caso do Brasil, que, durante o período 1964-1985, teve no futebol o centro de suas atenções, especialmente a partir da eleição indireta do presidente militar Emílio Garrastazu Médici, que assentou como ponto de honra obter o tri-campeonato mundial na Copa do Mundo de 1970, vitoriosamente alcançado. A alienação imposta pelo autoritarismo por meio do esporte levou a oposição a parodiar Karl Marx, dizendo que "o futebol é o ópio do povo".
No totalitarismo, o Governo tende a endeusar-se, implantando uma verdadeira ditadura de partido único, confundindo o Partido com o Estado.
Isto nunca se viu na América Latina, com a única exceção do regime de socialismo "foquista" ou "castrista" implantado em Cuba a partir de 1959. Ali, a adoração do povo cubano por Fidel Castro somente encontrou paralelo no fanatismo norte-coreano em torno de Kim Il-Sung e seu filho e sucessor Kim Jong-il.
Este foi também o caso dos regimes comunistas de estilo bolchevique, que procuravam, inclusive, moldar a consciência dos jovens ao modelo imposto pelo regime. Na antiga União Soviética, as escolas primárias ensinavam as crianças a cantar músicas com títulos como "Meu Avozinho Lênine", visando confundir os valores familiares com os valores revolucionários.
Hitler tentou imitar o modelo comunista, com a instituição das "juventudes hitleristas", mas não com o mesmo êxito.
Nos regimes totalitários, toda a iniciativa pessoal dos cidadãos deve ser canalizada para o Estado, que não reconhece a existência de nada que não seja ele mesmo. Esta concepção de governo foi criticada, pelo método de ser levada às útimas conseqüências, na ficcção de George Orwell, que no seu romance 1984, idealizou o regime totalitário do Grande Irmão, que proibia aos seus cidadãos até mesmo o direito de ter amor conjugal uns pelos outros, pois somente se podia amar ao Grande Irmão.

Autoridade
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Autoridade é um gênero ou uma simples fonte de poder. É a base de qualquer tipo de organização hierarquizada, sobretudo no sistema político. É uma espécie de poder continuativo no tempo, estabilizado, podendo ser caracterizado como institucionalizado, ou não, em que os subordinados prestam uma obediência incondicional, ao individuo ou a instituição detentores da Autoridade. Ou seja, a Autoridade transmite a mensagem de ordem sem dar razões ou algum argumento de justificação e os indivíduos subordinados a esta autoridade aceitam e obedecem sem questionar.
Relações de Autoridades
O poder dos pais sobre os filhos na família, o mestre sobre os alunos na escola, o poder de um Chefe de Igreja sobre os fiéis, o poder de um empresário sobre seus funcionários, o poder de um chefe militar sobre seus soldados, entre outros.

Formas de classificação
Segundo Bobbio existem três formas de se classificar o poder da autoridade: primeira é a forma coercitiva onde a autoridade estabelece suas diretrizes baseadas na aplicação de sanções físicas; a remunerativa, onde a Autoridade é baseada no controle de recursos e das redistribuições materiais; e a normativa, baseada na alocação dos prêmios e privações simbólicas.

Autoridade como Poder Legítimo
De acordo com Norberto Bobbio, a segunda e mais comum definição de Autoridade considera que nem todo o poder estabilizado é Autoridade, mas somente aquele em que a disposição de obedecer de forma incondicional se baseia na crença da legitimidade do poder. Ou seja, o poder da Autoridade é considerado legitimo por parte dos indivíduos ou grupos que participam da mesma relação de poder. Nesta concepção a Autoridade tem o direito de mandar e os subordinados o dever de cumprir com as diretrizes proferidas pela Autoridade, portanto, na Autoridade é a aceitação do poder como legítimo que produz a atitude mais ou menos estável no tempo para a obediência incondicional às diretrizes que provêm de uma determinada fonte. Obediência torna-se durável mas não permanente pois de tempos em tempos a legitimidade do poder desta autoridade sofre a necessidade de ser reafirmada.

Relações de Autoridades
Autoridade fundada sobre a legitimidade democrática (renovação do processo eleitoral), autoridade carismática de um chefe religioso (necessidade de ações extraordinárias para garantir que este possui a graça divina), dentre outras.

Abuso de autoridade
É quando alguém resolve abusar do seu poder de autoridade e usar critérios particulares para fazer valer a sua vontade, muitas vezes pessoal e não baseada em critérios justos.
Alguns exemplos podem ser o funcionário público que acha que é dono do espaço público só porque tem autoridade para cuidar do local e é protegido pela lei. Ou quando uma pessoa detentora de autoridade usa critérios baseados em abuso de autoridade e preconceitos. Ou o político que acha que pode tomar decisões de autoridade sem consultar democraticamente o povo que o elegeu, não percebendo que só tem essa autoridade porque foi o povo quem o colocou lá e por conseguinte deve explicações a ele. Tipicamente o abuso de poder é uma forma (seja ela majoritária ou minoritária) de ditadura.

Autoridade no contexto religioso
A questão da autoridade no contexto religioso pode partir da concepção agostiniana da vida monástica e de como o problema do confrontamento dessa vida com a estratificação social e com a autoridade cria uma série de desafios. Ele mesmo era responsável por três monastérios em Hipona e assumia que num monastério todos deveriam compartilhar a vida como um só corpo e coração em busca de Deus. Contudo, Agostinho temia que a vida monástica levasse a uma espécie de "competição ascética". Assim, reconhece que tais comunidades poderiam não funcionar sem uma autoridade central, mas ao menos tempo se essa autoridade central se sobressaísse de alguma maneira, não teríamos mais apenas um corpo, um coração, e as coisas poderiam não funcionar muito bem. Agostinho julgava necessário equilibrar a força da autoridade com as necessidades da comunidade monástica, e tal equilíbrio deveria ser zelado pela autoridade. Um superior deve ser obedecido mas também deve saber perdoar.

sábado, 6 de setembro de 2008

História - O regime militar no Brasil

Regime Militar
por
Bolívar Lamounier, com a colaboração de
O. Amorim Neto e
J. L. de Mattos Dias
O regime militar nasceu de um golpe de estado desfechado a 31 de março de 1964 contra o presidente João Goulart. Apoiaram o golpe os partidos conservadores (PSD e UDN), o empresariado, os proprietários rurais e a classe média urbana, unidos, acima de tudo, para dar combate ao comunismo e à corrupção. As causas imediatas do colapso do regime da Carta de 1946 são assim resumidas por José Guilherme Merquior: "Instabilidade governamental, desintegração do sistema partidário, virtual paralisia da capacidade decisória do Legislativo, atitudes equívocas por parte do presidente Goulart, quando nada com respeito à sucessão; a ameaça representada por uma reforma agrária mal definida; inquietação militar em face da tolerância do governo aos motins dos sargentos; e radicalismo crescente, tanto da direita como da esquerda (...), tudo isto complementado pela inflação em alta e, naturalmente, pelo fantasma assustador da revolução cubana" ("Patterns of State Building in Brazil and Argentina," in Hall, J.A organizador, States in History, London; Blackwell, 1986, p. 284).
O novo regime, todavia, evitou uma ruptura completa com os fundamentos constitucionais da
democracia representativa. Embora tenha abolido já de início as eleições diretas para a Presidência e posteriormente para os governos estaduais e principais prefeituras, manteve a periodicidade e a exigência de um mínimo de legitimação democrática para esses mandatos, por meio da eleição indireta pelo Congresso ou pelas assembléias, conforme o caso. Ademais, os líderes militares reiteraram, diversas vezes, a intenção de permanecer por pouco tempo no poder.
A partir de 1968, em resposta à pressão do movimento estudantil e ao início da luta armada por parte de setores radicalizados da
oposição, o regime militar se enrijece, passando o País pelo período de maior repressão política de sua história sob a presidência do general Garrastazu Médici (1969-1974). Estes fatos acabaram se sobrepondo à intenção inicial dos militares de permanecer pouco tempo no poder. Aos militares, contudo, faltava uma idéia clara sobre as reformas econômicas e político-institucionais que teriam de implantar com seu prolongamento no poder. O sistema militar tampouco podia propor-se como definitivo, pois isso implicaria romper definitivamente as pontes que lhe asseguravam um mínimo de legitimidade.
Com a ascensão do general Geisel à Presidência, em março de 1974, tem início a chamada "abertura gradual", cujo objetivo era afrouxar pouco a pouco as amarras ditatoriais do regime e, assim, evitar confrontos traumáticos. A característica principal do processo de abertura patrocinado por Geisel foi seu extremo gradualismo, seu caráter por assim dizer experimental e, por conseguinte, a permanente incerteza que durante vários anos pairou quanto a seus rumos e até mesmo quanto à sua continuidade.
Ainda em 1974, realizaram-se eleições para o Congresso, num momento em que ninguém duvidava de mais uma tranqüila vitória do partido do governo, a Arena. O resultado foi o inverso: uma rotunda derrota para o governo. O MDB cresceu de 12% para 30% do Senado, conquistando 16 das 22 cadeiras em disputa e de 28% para 44% na Câmara dos Deputados. A magnitude dos ganhos da oposição trouxe para primeiro plano duas dificuldades que as diretrizes iniciais da abertura não haviam contemplado: (1) a possibilidade de um novo impasse institucional, dado o caráter bipartidário do sistema; e (2) os votos oposicionistas achavam-se fortemente concentrados nos estados economicamente mais dinâmicos do País. Com a eleição de 1974, o governo viu-se, então, diante de pressões contraditórias: de um lado, a necessidade de começar a construir pontes com a sociedade civil, tendo em vista a magnitude e os contornos nitidamente plebiscitários (antigoverno) do crescimento eleitoral do MDB; de outro, a necessidade de preservar a coesão política do campo governista e, especialmente, das
Forças Armadas.
Uma das alternativas adotadas pelo regime para fazer frente à crescente onda oposicionista foi manter o elevado ritmo de crescimento econômico, iniciado em 1967, ainda que a necessidade de desaquecer a economia já começasse a se tornar evidente.
A sucessão do general Geisel pelo general João Baptista de Oliveira Figueiredo, no início de 1979, concluiu de maneira frustrante uma etapa do processo de liberalização. Frustrava-se a expectativa de que a sucessão representasse a culminação do processo de abertura e conduzisse o País diretamente à plenitude democrática, sinalizando o regime que decidira prolongar a estratégia "gradual e segura" de abertura política. Todavia, importantes demandas da oposição - como a anistia a todos os cidadãos antes punidos com cassação e perda dos direitos políticos, bem como aos exilados por participação em ações armadas, e o restabelecimento praticamente total da liberdade de imprensa - foram atendidas em 1978/79.
Em dezembro de 1979, o governo promove a reforma partidária - também reclamada por líderes oposicionistas que não desejavam integrar-se ao MDB. Ao fazê-la, o governo dava ao mesmo tempo um grande passo para desfazer a velha frente de oposições e livrar-se do impasse plebiscitário embutido na estrutura bipartidária. No começo da década de 80, cinco novos partidos conseguem se firmar na arena política: PDS (partido do governo), PMDB, PT, PDT e PTB. Estes partidos disputaram, em 1982, as primeiras eleições diretas para governador desde 1965, casadas com as eleições para o Congresso e para as assembléias estaduais. Contados os votos, constatou-se que o processo eleitoral continuava praticamente bipartidário, e que a oposição elegera dez dos 22 governadores, inclusive os de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. O enfrentamento plebiscitário que se quisera eliminar com a reforma partidária de 1979 estava de volta, agora num contexto de aguda recessão, crescente desemprego e visíveis sinais de debilitamento entre importantes lideranças políticas do regime.
Tendo conquistado os principais governos estaduais, a oposição passou a dispor de suportes de poder suficientes para tentar fazer o sucessor do general Figueiredo. Absorvendo deserções das hostes do partido do governo e sabendo capitalizar a energia cívica mobilizada pelo frustrado movimento a favor de eleições diretas para presidente (desencadeado no primeiro trimestre de 1984), a oposição, empunhando a candidatura de Tancredo Neves, do PMDB mineiro, um político moderado e conciliador, logrou formar a maioria necessária para vencer a disputa sucessória no Colégio Eleitoral, em janeiro de 1985, encerrando o ciclo dos governos militares.
períodos
colônia monarquia primeira república
revolução de 1930 estado novo regime militar

História - O golpe militar de 1964

O golpe de 1964
Fatos e Imagens
Na madrugada do dia 31 de março de 1964, um golpe militar foi deflagrado contra o governo legalmente constituído de João Goulart. A falta de reação do governo e dos grupos que lhe davam apoio foi notável. Não se conseguiu articular os militares legalistas. Também fracassou uma greve geral proposta pelo Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) em apoio ao governo. João Goulart, em busca de segurança, viajou no dia 1o de abril do Rio, para Brasília, e em seguida para Porto Alegre, onde Leonel Brizola tentava organizar a resistência com apoio de oficiais legalistas, a exemplo do que ocorrera em 1961. Apesar da insistência de Brizola, Jango desistiu de um confronto militar com os golpistas e seguiu para o exílio no Uruguai, de onde só retornaria ao Brasil para ser sepultado, em 1976. Antes mesmo de Jango deixar o país, o presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, já havia declarado vaga a presidência da República. O presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, assumiu interinamente a presidência, conforme previsto na Constituição de 1946, e como já ocorrera em 1961, após a renúncia de Jânio Quadros. O poder real, no entanto, encontrava-se em mãos militares. No dia 2 de abril, foi organizado o autodenominado "Comando Supremo da Revolução", composto por três membros: o brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo (Aeronáutica), o vice-almirante Augusto Rademaker (Marinha) e o general Artur da Costa e Silva, representante do Exército e homem-forte do triunvirato. Essa junta permaneceria no poder por duas semanas.
Nos primeiros dias após o golpe, uma violenta repressão atingiu os setores politicamente mais mobilizados à esquerda no espectro político, como por exemplo o CGT, a União Nacional dos Estudantes (UNE), as Ligas Camponesas e grupos católicos como a Juventude Universitária Católica (JUC) e a Ação Popular (AP). Milhares de pessoas foram presas de modo irregular, e a ocorrência de casos de tortura foi comum, especialmente no Nordeste. O líder comunista Gregório Bezerra, por exemplo, foi amarrado e arrastado pelas ruas de Recife.
A junta baixou um "Ato Institucional" – uma invenção do governo militar que não estava prevista na Constituição de 1946 nem possuía fundamentação jurídica. Seu objetivo era justificar os atos de exceção que se seguiram. Ao longo do mês de abril de 1964 foram abertos centenas de Inquéritos Policiais-Militares (IPMs). Chefiados em sua maioria por coronéis, esses inquéritos tinham o objetivo de apurar atividades consideradas subversivas. Milhares de pessoas foram atingidas em seus direitos: parlamentares tiveram seus mandatos cassados, cidadãos tiveram seus direitos políticos suspensos e funcionários públicos civis e militares foram demitidos ou aposentados. Entre os cassados, encontravam-se personagens que ocuparam posições de destaque na vida política nacional, como João Goulart, Jânio Quadros, Miguel Arraes, Leonel Brizola e Luís Carlos Prestes. Entretanto, o golpe militar foi saudado por importantes setores da sociedade brasileira. Grande parte do empresariado, da imprensa, dos proprietários rurais, da Igreja católica, vários governadores de estados importantes (como Carlos Lacerda, da Guanabara, Magalhães Pinto, de Minas Gerais, e Ademar de Barros, de São Paulo) e amplos setores de classe média pediram e estimularam a intervenção militar, como forma de pôr fim à ameaça de esquerdização do governo e de controlar a crise econômica. O golpe também foi recebido com alívio pelo governo norte-americano, satisfeito de ver que o Brasil não seguia o mesmo caminho de Cuba, onde a guerrilha liderada por Fidel Castro havia conseguido tomar o poder. Os Estados Unidos acompanharam de perto a conspiração e o desenrolar dos acontecimentos, principalmente através de seu embaixador no Brasil, Lincoln Gordon, e do adido militar, Vernon Walters, e haviam decidido, através da secreta "Operação Brother Sam", dar apoio logístico aos militares golpistas, caso estes enfrentassem uma longa resistência por parte de forças leais a Jango. Os militares envolvidos no golpe de 1964 justificaram sua ação afirmando que o objetivo era restaurar a disciplina e a hierarquia nas Forças Armadas e deter a "ameaça comunista" que, segundo eles, pairava sobre o Brasil. Uma idéia fundamental para os golpistas era que a principal ameaça à ordem capitalista e à segurança do país não viria de fora, através de uma guerra tradicional contra exércitos estrangeiros; ela viria de dentro do próprio país, através de brasileiros que atuariam como "inimigos internos" – para usar uma expressão da época. Esses "inimigos internos" procurariam implantar o comunismo no país pela via revolucionária, através da "subversão" da ordem existente – daí serem chamados pelos militares de "subversivos". Diversos exemplos internacionais, como as guerras revolucionárias ocorridas na Ásia, na África e principalmente em Cuba, serviam para reforçar esses temores. Essa visão de mundo estava na base da chamada "Doutrina de Segurança Nacional" e das teorias de "guerra anti-subversiva" ou "anti-revolucionária" ensinadas nas escolas superiores das Forças Armadas.
Os militares que assumiram o poder em 1964 acreditavam que o regime democrático que vigorara no Brasil desde o fim da Segunda Guerra Mundial havia se mostrado incapaz de deter a "ameaça comunista". Com o golpe, deu-se início à implantação de um regime político marcado pelo "autoritarismo", isto é, um regime político que privilegiava a autoridade do Estado em relação às liberdades individuais, e o Poder Executivo em detrimento dos poderes Legislativo e Judiciário.
Já no início da "Revolução" ficou evidente uma característica que permaneceria durante todo o regime militar: o empenho em preservar a unidade por parte dos militares no poder, apesar da existência de conflitos internos nem sempre bem resolvidos. O medo de uma "volta ao passado" (isto é, à realidade política pré-golpe) ou de uma ruptura no interior das Forcas Armadas estaria presente durante os 21 anos em que a instituição militar permaneceu no controle do poder político no Brasil. Mesmo desunidos internamente em muitos momentos, os militares demonstrariam um considerável grau de união sempre que vislumbravam alguma ameaça "externa" à "Revolução", vinda da oposição política. A falta de resistência ao golpe de 1964 não deve ser vista como resultado da derrota diante de uma bem articulada conspiração militar. Foi clara a falta de organização e coordenação entre os militares golpistas. Mais do que uma conspiração única, centralizada e estruturada, a imagem mais fidedigna é a de "ilhas de conspiração", com grupos unidos ideologicamente pela rejeição da política pré-1964, mas com baixo grau de articulação entre si. Não havia um projeto de governo bem definido, além da necessidade de se fazer uma "limpeza" nas instituições e recuperar a economia. O que diferenciava os militares golpistas era a avaliação da profundidade necessária à intervenção militar. Desde o início havia uma nítida diferenciação entre, de um lado, militares que clamavam por medidas mais radicais contra a "subversão" e apoiavam uma permanência dos militares no poder por um longo período e, de outro lado, aqueles que se filiavam à tradição de intervenções militares "moderadoras" na política – como havia acontecido, por exemplo, em 1930, 1945 e 1954 – seguidas de um rápido retorno do poder aos civis. Os mais radicais aglutinaram-se em torno do general Costa e Silva; os outros, do general Humberto de Alencar Castelo Branco. Articulações bem-sucedidas na área militar de um grupo de oficiais pró-Castelo e o apoio dos principais líderes políticos civis favoráveis ao golpe foram decisivos para que, no dia 15 de abril de 1964, Castelo Branco assumisse a presidência da República, eleito, dias antes, por um Congresso já bastante expurgado. O novo presidente assumiu o poder prometendo a retomada do crescimento econômico e o retorno do país à "normalidade democrática". Isto, no entanto, só ocorreria 21 anos mais tarde. É por isso que 1964 representa um marco e uma novidade na história política do Brasil: diferentemente do que ocorreu em outras ocasiões, desta vez militares não apenas deram um golpe de Estado, como permaneceram no poder.
Celso Castro



Sugerimos a leitura dos verbetes
Atos Institucionais, Ligas Camponesas, Revolução de 1964, Comício das Reformas e Marcha da família com Deus pela liberdade que se encontram disponíveis nas páginas do Dicionário Histórico-Biografico Brasileiro.




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